(...) Sempre que distraidamente via seu nome
escrito lembrava-se de seu
apelido na escola primária: Margarida Flores de Enterro. Por que alguém não se
lembrava de apelidá-la de Margarida Flores do Jardim? É que as coisas
simplesmente não eram do seu lado. Pensou uma bobagem: até a sua pequena cara
era de lado. Em esquina. Nem pensava se era bonita ou feia. Ela era óbvia.
Depois.
Depois não tinha problemas de dinheiro.
Depois havia o telefone. Telefonaria para alguém? Mas sempre que telefonava
tinha a impressão nítida de que estava sendo importuna. Por exemplo,
interrompendo um abraço sexual. Ou então era importuna por falta de assunto.
E se alguém lhe telefonasse? Iria ter que conter o trêmulo da voz alegre por
alguém enfim chamá-la. Supôs o seguinte:
- Trim-trim-trim.
- Alô? Sim?
- É Margarida Flores de Jardim?
Diante da voz masculina tão macia, responderia:
- Margarida Flores de Bosques Floridos!
E a cantante voz a convidaria para tomarem chá de tarde na Confeitaria
Colombo. Lembrou-se a tempo que hoje em dia um homem não convidava para tomar
chá com torradas e sim para um drinque. O que já complicaria as coisas: para um
drinque se deveria ir na certa vestida de modo mais audacioso, mais misterioso,
mais pessoal, mais... Ela não era muito pessoal. E que incomodava um pouco, não
muito.
E, além do mais, o telefone não tocou.
Clarice Lispector
apelido na escola primária: Margarida Flores de Enterro. Por que alguém não se
lembrava de apelidá-la de Margarida Flores do Jardim? É que as coisas
simplesmente não eram do seu lado. Pensou uma bobagem: até a sua pequena cara
era de lado. Em esquina. Nem pensava se era bonita ou feia. Ela era óbvia.
Depois.
Depois não tinha problemas de dinheiro.
Depois havia o telefone. Telefonaria para alguém? Mas sempre que telefonava
tinha a impressão nítida de que estava sendo importuna. Por exemplo,
interrompendo um abraço sexual. Ou então era importuna por falta de assunto.
E se alguém lhe telefonasse? Iria ter que conter o trêmulo da voz alegre por
alguém enfim chamá-la. Supôs o seguinte:
- Trim-trim-trim.
- Alô? Sim?
- É Margarida Flores de Jardim?
Diante da voz masculina tão macia, responderia:
- Margarida Flores de Bosques Floridos!
E a cantante voz a convidaria para tomarem chá de tarde na Confeitaria
Colombo. Lembrou-se a tempo que hoje em dia um homem não convidava para tomar
chá com torradas e sim para um drinque. O que já complicaria as coisas: para um
drinque se deveria ir na certa vestida de modo mais audacioso, mais misterioso,
mais pessoal, mais... Ela não era muito pessoal. E que incomodava um pouco, não
muito.
E, além do mais, o telefone não tocou.
Clarice Lispector
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