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sábado, 27 de abril de 2013

Sucata e purpurina

            Afastada do movimento social e da atividade profissional há algum tempo, por vezes me deparo com a ‘real realidade’ que vivem os serviços de saúde especializados em DST/aids, as pessoas soropositivas ou doentes de aids e o movimento social de luta e prevenção à aids.
Como esperado, o governo municipal fala que está investindo em prevenção primária, descentralizando a testagem anti-HIV para as unidades básicas de saúde preconizando “o apoio matricial como dispositivo de intervenção junto à atenção básica, pautado pela noção de território, intersetorialidade, integralidade, considerando o trabalho organizado pelo princípio de responsabilidade compartilhada entre a equipe de referência e serviços especializados, e o estabelecimento da continuidade na atenção em saúde...” mas, na prática é isso que acontece? O governo estadual compartilha desta filosofia adotando a responsabilidade compartilhada, em especial aqui em Porto Alegre, onde acabam desembocando pacientes de todos os rincões do Estado?
Há muito me preocupo com a assistência prestada, de que adianta saber a sorologia se você não terá garantia de um atendimento mínimo? O diagnóstico precoce, ao invés de servir para antecipar os agravos na saúde dos que vivem com HIV, surge como mais uma problemática, ao se considerar os danos psíquicos que a falta do acompanhamento irá trazer.
Os postos de saúde gerenciados pelo município, seguem encaminhando os pacientes com aids para os serviços especializados que estão cada vez mais, superlotados e sucateados – fico horrorizada ao pensar nos homens e mulheres que dependem unicamente do SUS para monitorar a sua saúde e controlar a infecção pelo HIV. Os profissionais lotados nos serviços básicos, simplesmente ‘transferem’ os pacientes: o problema deixa de ser deles, passando a um outro nível que se encontra saturado pela ausência de investimentos.
O governo estadual, que deveria atuar na capacitação, deixa os profissionais de saúde que atuam na área, por sua conta e risco: ao se deparar com os pacientes encaminhados pelos serviços básicos, que não fazem o seu serviço, precisam se contorcer para evitar que tudo fique ao “Deus dará”; para amenizar, presta uma assistência meia-boca à população, já que essa não é sua função...
Não ouço falar de ações do movimento social para denunciar o descaso dos governos, os ‘ativistas’  encontram-se acomodados e confortáveis em seus postos de representação e não estão preocupados em buscar formas alternativas de enfrentamento para velhas e novas infecções.
Eu tenho formação em saúde comunitária, os princípios do matriciamento são os preconizados na Lei 8080/90, que regulamenta o SUS e que traz no seu artigo 1º: “os serviços de saúde devem assegurar acesso para a promoção, proteção e recuperação da saúde” – tríade indispensável para o bom funcionamento do sistema.
Os astros e estrelas, dos diferentes setores, reúnem-se em inúmeros seminários e encontros que objetivam, na teoria, elucidar as questões referentes à epidemia; na prática, se efetiva como um espaço de gasto exacerbado do dinheiro público e espaços de exibicionismo individual – as pessoas que vivem com aids são um mal necessário e, totalmente secundárias ao processo. Me refiro aqui, não àquelas e àqueles que fazem de conta que representam o movimento social mas, à população, que vai ao serviço buscar atendimento e não encontra resolutividade para a sua demanda, qualquer que seja.
Em que momento ocorrerão mudanças que impactem na vida da população?
Desacredito de que os atores responsáveis, tomarão as rédeas daquilo que lhes compete.
E as pessoas atingidas pela aids? Cada um por si e salve-se quem puder!!

Celia Ruthes
Abril/2013

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